Um tinido estridente e incômodo. Um ruído ensurdecedor, infernal. Os quartos foram transformados em salas cujas paredes eram feitas de azulejos eletrônicos. As tevês cobriam cada centímetro de até então papel de parede azul marinho e de outro lado pôsteres adolescentes. A intensidade do brilho era esgotante, mas o pior era o chiado. Chiado que ia além de tímpanos e martelos, ondas de som que adentravam o cérebro e chocavam e chacoalhavam os neurônios.
De uma fresta na porta a mãe espiava descrente. O menino olhava de olhos exorbitados e sua pupila dilatada como que contida numa escuridão de uma eternidade sem luz. Ele parecia em transe. E reagia com uma lerdeza descomunal. A mãe só segurava em lágrimas a esperança de que aquela máscara de zumbi fosse cair. Mas não cairia.
Ele estava condenado a passar uma semana olhando para aquelas telas. Eram apenas riscos, elétrons chamuscando-se e implodindo. Aquelas imagens tanto fantasmagóricas. Eram granulados e ruídos.
A garota olhava atarantada e não menos zumbi. Os olhos sujos de lápis de olho corroboravam na perspectiva mórbida que apresentava. O caráter pálido e enfermo, sua pele transparente fazia com que as veias aparecessem, desenhavam um caminho todo frenético. Frenético era aquele lugar transbordado de luz.
A mãe fora julgada inocente.
"...uma pobre coitada desmerece sequer alguma consideração. Saia..."
Desmerecia... Eles mereciam, condenados... Que se tratava tudo aquilo afinal?
A mulher sobe as escadas até o sótão à procura de refúgio. As paredes estavam vazias. Não havia mobília, não havia mais nenhum ser animado nem inanimado. Vivo ou morto. Só os dois quartos, inacessíveis, e o resto era silêncio e vazio. E alienação.
As janelas foram tapadas com madeiras. O sol às vezes se mostrara por frestas e mal se sabia quantos dias se passara. O sótão era tentador. Estender-se naquele chão e dormir, pois nem mesmo um pesadelo seria tão ruim.